Texto escrito por José Martins Freire Júnior
De acordo com o PCN (1998), as diretrizes políticas para educação física nos anos 70 eram baseadas em um modelo piramidal, que tinha como base a educação física escolar e o desporto juvenil. No segundo nível da pirâmide, encontrava-se a busca pela melhora da aptidão física da população urbana, que ficava sob a responsabilidade da iniciativa privada sendo visto como o desporto de massas e no topo da pirâmide encontrava-se o desporto de elite.
Nos anos 80, este modelo passa a ser contestado, já que não colabora para que o Brasil se torne uma potência olímpica ou mesmo aumente o número de praticantes de esportes da elite; com isso ocorre uma crise de identidade da área, gerando uma mudança expressiva nas políticas educacionais. Com relação às aulas de educação física escolar estas passaram a ser trabalhadas nas primeiras séries do Ensino Fundamental com o objetivo de desenvolver aspecto psicomotor do aluno e com isso retirar da escola a função de promover o esporte de alto rendimento (BRASIL, 1998).
A tradição cultural nas aulas de educação física tem sido, ao longo dos anos, muito perversa com alunos que são desprezados durante a passagem pela educação básica, pois não atendem aos padrões motores desejados e por muitas vezes tornam-se adultos que possuem certa mágoa em relação as aulas de educação física escolar. Pois ficaram à margem das atividades propostas nestas aulas e infelizmente não possuem ou mesmo não desenvolveram a autonomia para usufruir da cultura corporal de movimento. Com isso até hoje não conseguem se envolver em práticas esportivas por não acreditarem na capacidade própria de participarem e também por não reconhecerem a importância deste envolvimento (DAOLIO, 1996).
Pode-se perceber que o esporte praticado por crianças e adolescentes nesta fase de desenvolvimento, pouco difere do modelo esportivo de alto rendimento praticado pelo adulto. As diferenças são percebidas apenas na diminuição do tamanho da bola, da quadra, do tempo de jogo, entre outros aspectos.
Contudo, há as atitudes condenáveis, como: insultos da torcida e de técnicos, passam a fazer parte desse meio, mesmo na presença de crianças. Outro agravante são os treinamentos que consistem na realização e repetição de tarefas exaustivas similares ao modelo adulto, tendo como foco os resultados positivos nas competições. Parece que tais condições também são encontradas no ambiente escolar, exemplo disso, são as equipes de competição, formadas e selecionadas durante as aulas de educação física escolar. Quando isso acontece, a intenção de ensinar o esporte a todos e que todos o pratiquem deixa de existir para dar oportunidade para a busca dos melhores (KORSAKAS; ROSE JÚNIOR, 2002).
Com relação a situação descrita, podemos indagar algumas possibilidades para entender os motivos que ainda levam as aulas de Educação Física terem como fim o rendimento esportivo: concordando que o esporte, mesmo dentro da escola, é o retrato fiel da sociedade em que vivemos.
Por tanto, ele se desenvolve de forma excludente, competitiva; a Educação Física escolar, como o esporte, é relegada a segundo plano, diante as autoridades que gerem a nossa sociedade, no caso da escola, pela a equipe de direção, na qual só se consegue um destaque quando se chega com troféus conquistados em disputas entre escolas. Disputas que em muitas vezes são pautadas por violências, humilhações, desrespeitos entre outras situações calamitosas. Costumeiramente é só nesse cenário, na vitória em torneios, que o profissional de Educação Física é “enxergado” pela unidade escolar.
De acordo com o estudo de Darido (2004), foi possível perceber que nas aulas de educação física escolar apenas uma parcela da turma participa efetivamente nas atividades propostas pelo professor e, na maioria das vezes, estes alunos são os mais habilidosos. Há um aspecto intrigante, pois muitos professores ainda estão fortemente ligados a perspectiva esportivista e por este motivo, acabam valorizando os alunos com melhor desempenho nas aulas e colaboram para o afastamento daqueles alunos que necessitam ainda mais de estímulos para a participação nas atividades, gerando assim um número maior de alunos dispensados ou que simplesmente não participam das aulas.
O objetivo não é remover o esporte do conteúdo curricular das aulas de educação física escolar, mas sim desenvolvê-lo de uma maneira diferente, dando um novo enfoque e assim assegurar que os alunos compreendam o esporte a partir de suas origens, evoluções e possibilidades de atuação. Também é importante desenvolver a reflexão sobre as inúmeras dimensões culturais relacionadas ao esporte e que são fontes de aprendizado, assim como os padrões de beleza impostos pela mídia, os conceitos de saúde, as políticas esportivas e as formas de discriminação presentes neste meio e na sociedade (BARROSO; DARIDO, 2006).
O profissional de Educação Física em seu campo de atuação profissional, tem como obrigação possibilitar seus alunos as mais vastas experiências motoras possíveis, e essas experiências vêm através das inúmeras possibilidades que a disciplina em questão oferta, entre elas o esporte, entretanto é importante que em sua prática, o profissional construa conhecimentos teóricos com os discentes das atividades que serão desenvolvidas e não somente “jogar por jogar”. Esses conhecimentos, no caso específico do esporte, podem estar no campo da história, na evolução da modalidade, nos benefícios biológicos, nas contribuições sociais, entre outras infinitas possibilidades que constroem o campo do saber.
Acreditamos que se o esporte foi desenvolvido na escola como possibilidade de formação de sujeito crítico-emancipado e autônomo, construtor da cidadania, crianças e adolescentes que sejam “indiferentes as diferenças”, que a escola e os professores possibilitem uma Educação Física de qualidade com quantidade, pois qualidade sem quantidade é privilegio, tudo isso através do puro prazer que a pratica esportiva nos traz, assim podemos afirmar que o esporte é herói.
Em contrapartida, se o esporte na escola for pautado pela segregação, exclusão, tendo como o maior objetivo, a competição, privilegiando os mais habilidosos em detrimento dos menos, uma prática na direção da submissão de seus alunos, sob o olhar que a escola é o local de formação de possíveis atletas, nesse cenário pode-se dizer que o esporte vai para o lado vilão da história.
O professor José Martins Freire Júnior é mestre em educação física e docente no curso de educação física da Escola Superior de Cruzeiro - ESC.
O Instituto Esporte Vale atua na formação de profissionais competentes para o ensino do esporte.
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