segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Métodos de treinamento: a importância e a armadilha da modernidade


Texto escrito por Igor Moreira
No meu último texto publicado neste blog, trouxe um micro fragmento da história do futebol a título de elucidar o processo desse esporte no Brasil. Provoco ao texto que segue alguma reflexão sobre caminhos dessas transformações, fazendo com que narrativas nessa linha serem recorrentes “não se faz mais jogadores como antigamente”; contudo para o presente texto peço certa licença acadêmica. 

Falar em aula/ treinamento e suas formas de organização perpassam por métodos. Em busca rápida ao dicionário online, método significa: processos, sistemas, arrumações, investigações, maneiras, meios, ordens. Ou, modo usado para realizar alguma coisa; técnica: método científico. Adotaremos essa segunda definição, então métodos de treinamento, como sendo, o modo usado para realizar um treino. 

Diante dessa definição em conjunto com o pensamento Aristotélico, quando diz “o que nos torna iguais é que somos diferentes”, e pensar o futebol, ou outros esportes coletivos, por pretender buscar o empenho individual, atrelado a um trabalho grupal e com base em métodos de treino para realizar o trabalho, percebemos a complexidade que é ser professor/treinador.  

Ao remeter a alguns métodos e suas nuances, dentre eles: analítico, global, situacional, táticas, entre outras possibilidades, e colocar nas mãos de uma pessoa que objetiva fazer sua equipe jogar, mas tendo que enfrentar as individualidades, são desafios a serem enfrentados. 

No discurso as falas tangenciam para o percurso da autonomia, tomada de decisão, emancipação, que a formação é pautada pela liberdade, que vencer relega-se a segundo plano, nos processos de formação. 

Mas o que muito se vê, são técnicos eufóricos, nas beiras das linhas que ao invés de ensejar um bom jogo, anseiam pela vitória, ou como já mencionou Scaglia (2020), o professor deve almejar o empenho dos seus alunos e não o desempenho; Santana (2019) nos orienta a explorar a individualidade e negar o individualismo. 

Contudo, esses conceitos devem sair do campo semântico e adentrar as práticas, e fazer nossos alunos driblar “atrás”, buscar a joga individual que os modernos chamam de um contra um, buscar o lance diferente, mesmo que ela custe o erro e consequentemente uma derrota; necessita-se menos fones de ouvido e mais diálogo. Valorizar a individualidade e coibir o individualismo. 

Recomendo a todos professores, técnicos, alunos e atletas em formação ou “formados” que assistam o filme “O jogo da paixão” com Kevin Costner, onde o ator é um jogador de golfe, estilo boleiro, e entra em um campeonato importante contra seu algoz, estritamente profissional, um Cristiano Ronaldo e  Kevin Costner com o título praticamente ganho, se permite a ousar e buscar uma jogada quase impossível, se é quase, porque há possibilidades, ele segue seu coração e busca a plasticidade da jogada, perde o título. Depois de inúmeras tentativas consegue a tão almejada tacada e faz essa magnífica atitude ser recordada por esse que escreve a vinte quatro anos depois de ter assistido.

Por que não se faz mais jogadores como antigamente? Porque desde pequeno o professor engessa as possibilidades da ousadia dos alunos, ousadia e alegria ficaram somente na música do cantor Thiaguinho, os técnicos sob égide da evolução do esporte utilizam em demasia os métodos, mas sem a apropriação adequada dessas formas de treinamentos, que são de grande importância. Jesus não me deixa mentir, o Jorge. 

Falam do ensino a partir do jogo para dar autonomia ao aluno, mas constroem atividades com todas as ações determinadas, pensam no analítico para melhorar os fundamentos, mas o que ocorre são descabidas sessões de repetição de movimento; fala-se em situacional, sendo situação determinada por uma única pessoa, entre outras formas de apropriar, sem propriedade. O drible é heresia, o passe de efeito está escrito como o oitavo pecado capital, a brutalidade (o indivíduo forte) é elemento fundante para alçar a um lugar ao sol. 

Buscar aquilo que o professor Paulo Freire chamou de ‘inédito viável’ seria ressuscitar Cazuza, mas com outra interpretação de “um museu de grandes novidades”, o museu seria a retomada do nosso jeito de jogar futebol e as novidades seriam a inserção dos métodos, que bem utilizados são conspícuos para construção de equipes organizadas e jogadores inteligentes, não só corporalmente.    

Enquanto isso, sigo a trilhar dos meus sinuosos caminhos e continuo a ser essa metamorfose ambulante, encontrando em Thomas More (1516) a Utopia, por que não quero ter aquela velha opinião formada sobre tudo. Para tanto em consonância com Távola (1985) encerro me apropriando das sábias palavras desse autor:

O futebol do futuro vai ser sem o gol como única aferição da vitória e sem juiz. O momento do gol será festejado pelos dois times e cumprimentados os autores. Nem será necessário a bola transpor a linha. Uma bela jogada de conclusão infeliz será considerada meio gol pelo time adversário que aceitará a qualidade de sua urdidura, e mandará anotar meio ponto. Haverá uma qualificação para a beleza das jogadas a valer pontos e dela participarão os dois times, mais empenhados em descobrir a beleza do que em evitá-la. O resultado final será a mescla do número de gols, como o de escanteios, o de jogadas consideradas belas e atitudes dignas de registro. Os dois times se reunirão para proclamar e ambos comemorarão o fato de terem feito o espetáculo, aproveitando para verificar em que pontos melhoraram. No futebol do futuro, o adversário não servirá para ser superado ou superar, e sim para ajudar a conferir em que aspectos cada time superou-se (a si próprio e não o adversário). O adversário nem assim se chamará. Será o “solidário”. As notícias dirão: “A seleção brasileira solidarizou-se ontem com a da Alemanha na verificação dos pontos em que ambas progrediram. A do Brasil venceu a si mesma por três pontos e a da Alemanha empatou com o seu desempenho anterior. Ao final, todos juntos comemoraram a alegria de compartir o esporte e de ajudar um ao outro na tarefa da auto-superação” (TÁVOLA, 1985, p. 275).


O professor Igor Moreira é mestre em Políticas Sociais e docente no curso de educação física da Escola Superior de Cruzeiro - ESC. 


O Instituto Esporte Vale atua na formação de profissionais competentes para o ensino do esporte. 

www.ievale.com.br


Acreditamos no poder transformador do esporte


Você que compartilha dessa ideia, siga o IEVALE nas redes sociais, compartilhe nossos conteúdos e contribua para juntos avançamos no diálogo sobre o esporte.


Nenhum comentário:

Postar um comentário