Texto escrito por Rosangela Domingos
A Declaração Universal de Direitos Humanos norteia a universalidade e indivisibilidade dos direitos humanos. O preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma que o reconhecimento da dignidade inerente e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros da família humana é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.
É evidente que, a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a dignidade humana é uma ideia moral fundamental, em vez de um conceito legal, e, portanto, teoricamente dá as bases ou justifica leis e normas políticas que visam proteger as necessidades e interesses humanos fundamentais (Churchill, 2006). A dignidade foi definida em termos das condições mínimas de vida necessárias para um nível aceitável de existência humana (Nussbaum, 2006).
Outra forma de definir a dignidade aponta que um individuo a possui quando é livre para formar suas próprias intenções e pode agir de acordo com elas sem interferência (Driver, 2006).
Alguns teóricos versam que pessoas têm dignidade caso vivam suas vidas de acordo com as normas de sua comunidade, suas práticas e tradições. Essa forma de pensar é mais restrito do que o permitido por uma concepção de dignidade na autonomia. Certos comportamentos, por exemplo, podem ser avaliados como indignos e, portanto, eticamente inaceitáveis, caso acredite que violem normas sociais no seu território (Beyleved e Brownsword, 2001).
Uma concepção mais comum de dignidade presente na literatura atenua a ideia de que a dignidade depende de a pessoa ser bem-sucedida de algum modo. Concatenando com esse ponto de vista, os indivíduos têm dignidade caso estejam se realizando como seres humanos, com suas habilidades únicas plenamente desenvolvidas (Miller, 2007; Nussbaum, 2006).
Traremos para reflexão, Beyleved e Brownword (2001) que fizeram um ensaio de unificar seus vários significados fazendo uma distinção entre dignidade como empoderamento e como restrição.
A noção de dignidade como empoderamento ressalta a notoriedade da autonomia e da liberdade de movimento para os seres humanos ao longo das suas vidas. O empoderamento enfatiza o valor da autogovernança e para a capacidade e oportunidade dos indivíduos de exercerem ativa e livremente os objetivos que selecionaram sem interferência de outros.
O segundo, dignidade como restrição, reconhece seus vínculos delimitados sobre o modo como os indivíduos são tratados e também como ocorre interação e integração. Nessa perspectiva, as pessoas apenas mantêm sua dignidade se seguem as normas de sua comunidade e não agem de maneira a atrair vergonha sobre si ou outros.
Dialogando com o pensamento de Beyleved e Brownword, a dignidade dos seres humanos está localizada na capacidade de formular e perseguir os seus interesses no mundo, sem interferência injustificada de outras pessoas. Mas, o julgamento dos próprios indivíduos não são os únicos determinantes do que constitui uma vida digna. Para poder atuar em busca de objetivos pessoalmente selecionados, e sua tradução em planos de ação, as necessidades básicas também devem ser atendidas, bem como fornecidas oportunidades educacionais e suporte sociais.
O esporte e direitos humanos
Há questões sociais no Brasil na qual não foi possível erradicar a pobreza extrema, por exemplo, indivíduos e ou famílias inteiras em situação de rua, crianças e adolescentes em condições vulneráveis a drogas ilícitas e a violência física e psicológica, falta de alimentos nutritivos, água portável para se hidratar e para higienização mínima.
A discussão acima sobre o conceito de dignidade está ligada ao relacionamento da pessoa com outros de sua comunidade e, sem dúvida, com a humanidade. A dignidade depende da interconexão. E o esporte promove isso.
A implicação aos profissionais de educação física que atuam em projetos de educação social para indivíduos em situação de vulnerabilidade, indivíduos em situação de rua, indivíduos no sistema carcerário, e adolescente em cumprimento de medida socioeducativa, é que todos os atendidos e as atendidas têm o direito a tratamento que reflitam essa dignidade inerente.
Mesmo que indivíduos tenham agido de forma antiética e merecedora de sanção reparadora ou punitiva não significa que percam sua condição de iguais, ou seja, quaisquer respostas a atos infracionais cometidos por adolescentes ou crimes cometidos por adultos, devem ser desenvolvidos de modo a garantir o respeito.
As ações envolvem a promoção de conversas e atividades de sensibilização sobre o papel dos gestores, funcionários, docentes e alunos em relação ao respeito e asseguramento dos direitos humanos, na qual baseia-se em três características fundamentais: (a) autonomia ou a capacidade de tomar decisões importantes para si; (b) posse de um conjunto de recursos e capacidades mínimas, como educação, saúde e segurança para desenvolver-se; (c) liberdade, onde outras pessoas não impeçam alguém de aplicar sua própria concepção do que seja uma vida que vale a pena ser vivida (James Griffin, 2008, p. 33).
Programas esportivos de intervenção social devem fortalecer as habilidades individuais para atuarem como agentes morais e, assim, procurar equipá-los com habilidades de enfrentamento da vida, tais como habilidades de autorregulação e habilidades para resolução de problemas e ampliar suas competências emocionais.
Uma reflexão final gostaríamos de pontuar a necessidade de o Estado promover uma política voltada para o esporte e o lazer à luz dos direitos humanos. Isto significa propor políticas em primeiro plano, de inserção das camadas mais excluídas e discriminadas, das crianças e dos adolescentes, enquanto prioridade efetiva, dos portadores de deficiência, dos negros e negras, dos povos indígenas e dos pobres de um modo geral.
Os profissionais de educação física devem estar cientes de que o esporte não fará milagres, mas estará associado a outras ferramentas educacionais voltadas ao desenvolvimento humano.
A professora Rosangela Domingos é mestre pela Universidade Anhanguera de São Paulo e atua na Fundação Casa/SP.
O Instituto Esporte Vale atua na formação de profissionais competentes para o ensino do esporte.
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Excelente, nos faz repensar inúmeras atitudes 👏👏
ResponderExcluirFicamos felizes em trazer possibilidades reflexivas e contribuir na sua formação. Obrigado pelo feedback, nos ajuda muito a desenvolver o conteúdo.
ExcluirÓtimo texto. Infelizmente o aparato público quando tem qualidade fica a disposição daqueles que tem mais recursos. A dignidade que o esporte proporciona nas camadas mais pobres da sociedade reflete diretamente na ilusão de que "superar" as dificuldades é uma grande virtude, escondendo as ausências do estado e aumentando a desigualdade. O esporte funciona mais ou menos como as Universidades públicas no Brasil, quando a educação tem alta qualidade os "excluídos" cumpriram seu papel em nossa planejada sociedade, a maioria foi eliminada.
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